O nascer de vilas e cidades
Da beira de seus três rios – o Jaguari, o Atibaia e o Camanducaia -, podem-se reviver aspectos de um tempo colonial muito recuado. Encontramos, nos registros escritos no início do século XIX pelo famoso viajante francês Saint-Hilaire, um dos mais valiosos relatos sobre a capitania de São Paulo, ou ainda, sobre o que hoje é a região de Campinas e Amparo. Nele, o viajante identifica semelhanças com a “fronteira ocidental de Minas Gerais”. Ao percorrer as vilas Jundiaí, Campinas, Mogi-Mirim, Mogi-Guaçu, Casa Branca e Franca, por um traçado ainda hoje preservado (em grande parte) pela Rodovia SP-340, Saint-Hilaire identifica sinais da economia aurífera que, a partir da região das inas, passa a imprimir um novo ritmo de povoamento à região. De maneira semelhante a Campinas, cuja origem está vinculada às paradas dos tropeiros, Jaguariúna também guarda registros deste processo, ainda que desconhecidos do grande público. Nas terra em que hoje se encontram instaladas grandes empresas, interessadas em prosperar com base em uma excepcional posição geográfica, confrontamo-nos com registros de personagens – homens e mulheres, tropeiros, cargueiros, sitiantes, escravos, artífices, mascates – que em diferentes tempos, palmilharam o Caminho de Goiases em busca de comerciar. Na Jaguariúna e hoje, sobrevivem referências e expressões – em especial na linguagem cotodiana – que datam de pelo menos 200 anos atrás. Estamos falando do Bairro Tanquinho... Ali, um simples depósito natural de águas, e lá podemos entender quase dois séculos de história. Até hoje, no Bairro Tanquinho, moradores mais velhos não relutam em afirmar que este local deve seu nome à existência de um laguinho raso – lá, “onde existiu um tanquinho” -, no qual antigos tropeiros, viajantes e cargueiros constumavam parar para descansar, alimentar seus animais e se reanimar para prosseguir estrada. Na atualidade, o local mantém o nome oficial de Bairro Tanquinho. Era ali no tanquinho que viajantes provenientes e muito longe, levando mantimentos para abastecer a região das minas de “Goyaz”, costumavam parar, com suas tropas exaustas e sedentas, aproveitando para comerciar, socializar-se e iniciar relações de amizade, ou, ainda, novas paixões. Com o passar do tempo, foram-se instalando pequenos armazéns, vendinhas e ranchos, estrutura importante para dar sustentação ao ir-e-vir dos cargueiros. Nas vendinhas, consumia-se o tabaco, a aguardente e gêneros alimentícios da roça, produtos que, guardadas as particularidades de época, ofereciam aos viajantes os mesmos serviços que hoje procuramos no comércio a beira de estrada, quando paramos para tomar água, comprar biscoitinhos; enfim... as vendinhas eram úteis para os tropeiros, tanto quanto para as pessoas que resolviam fixar-se naquelas paragens, tando como principal meio de sobrevivência as atividades do comércio. E, assim, tudo começaca... e, assim, sem perceber, começava-se a “plantar” povoados e a “semear” vilas e cidades, processo, no entanto, muito lento, já que, até 1769, portanto 76 anos após informação oficial da descoberta do ouro por Antônio Rodrigues Arzão, em 1963, e por Bartolomeu Bueno de Siqueira, em 1964, o oeste paulista só possuía duas vilas: Jundiaí e Itu. Foi somente a partir daí, ou ainda, entre 1769 e 1836, que Campinas, Piracicaba, Mogi-Mirim, Porto Feliz, Araraquara, Capivari e Franca elevaram-se à mesma condição, fortalecendo-se a política de urbanização com vistas e povoamento. No curso do século XVIII, a reliação de um recenseamento no governo de Morgado de Mateus já indicaria a presença de 14.326 habitantes na região compreendida entre Mogi-Mirim, Mogi-Guaçu, Parnaíba, Araritaguaba, Jundiaí e Araçariguama (1766). Este dado atesta a proeminência de adensamento populacional promovido pela instalação de pousos tropeiristas e por núcleos povoadores decorrentes dos primeiros engenhos. Neste período, o que hoje reconhecemos por Jaguariúna começava a se definir como território habitado, sendo possível, portanto, na atualidade, recuar seus marcos de ocupação para 300 anos. Enfim, longe de fazermos qualquer apologia à natureza invasora e violenta das bandeiras, as circunstâncias e fatos históricos são claros quanto ao pape que os homens bandeiristas desempenharam na questão rudimentar da ocupação, qual seja, garantir e alargar as fronteiras do Brasil colônia. Livro: Vila Bueno ensaios para a história